O homem abriu seus olhos.

Ele estava deitado de barriga para cima, olhando para o céu azul que escurecia através de uma copa verdejante e delicada. Caules de bambu faziam um barulho preguiçoso na brisa cálida. Apesar de seus hematomas (e de uma dor de cabeça tremenda), ele conseguia sentir que o chão embaixo dele estava macio, coberto de folhas caídas. Estava quieto aqui, embaixo do bambu. O ar tinha cheiro de sal, e ele conseguia ouvir ondas a alguma distância dali.

Algo quebrou um galhinho à esquerda dele. Sobressaltado, ele olhou para todos os lados em busca da fonte do som, e congelou.

Art by Jonathan Kuo
Ilustração: Jonathan Kuo

A coisa parecia um lagarto, coberto de penas chamativas azuis e amarelas. Ele andava com as patas traseiras e carregava um ovo entre suas garras desproporcionalmente grandes. A criatura de olhos alaranjados virou-se para observar o homem no chão por um segundo. Ele gorjeou levemente antes de seguir seu caminho, chutando algumas folhas em seu trotear. Em um momento apenas ele desapareceu, tão rapidamente quanto aparecera.

O homem levou um tempinho para processar este encontro. A coisa-lagarto era novidade, mas tudo o mais sobre sua situação atual tinha uma sensação curiosa de déjà vu.

Ele levantou sua cabeça para ver a si mesmo. Ele usava um capuz azul, calças compridas e uma armadura peitoral de couro bem justa.

Nada daquilo lhe parecia familiar.

Ele sentou-se, resmungando com todo o esforço. Por fim, ele se levantou e cambaleou para longe dali, seguindo o caminho da coisa-lagarto.

O bambuzal se abriu a um arvoredo mais espaçado de palmeiras, ao mesmo tempo em que o solo fértil da floresta foi afinando e ficando arenoso. O homem ouviu o barulho das ondas aumentando, e cambaleou mais rapidamente para perto da água.

Ele saiu da mata para uma praia sem fim. A areia sob suas botas era macia igual farinha. O ar era pesado e úmido - ele se sentia encharcado mesmo que estivesse em terra seca. Algumas estruturas rochosas formavam um arco natural entre a praia e o mar, e a selva viçosa formava uma barreira imediata com a beira da areia.

O homem olhou para cima. O sol começava a se pôr e ele podia ouvir o canto dos pássaros costeiros pelo céu.

Ele olhou para os dois lados ao longo da praia.

"Tem alguém aí?"

A maré lambia suas botas gentilmente.

"TEM ALGUÉM AÍ?!" Chamava ele, e o medo aparecia em sua voz.

Depois que explicações lógicas foram metodicamente descartadas de sua lista mental, ele começou a ficar cada vez mais perto de entrar em pânico.

Ele não sabia como chegara ali. Ele não sabia seu próprio nome. Ele não sabia onde esta selva ficava, ou por que estava em uma praia, ou o que diabos era aquela coisa-lagarto. Por que ele estava coberto de hematomas? E por que sua cabeça doía tanto? E o que ele precisava fazer pra sair dali?!

Por um segundo, a imagem de um lugar estranho a ele passou por sua mente - cores e luzes e a ideia de sair. Ele sentiu um tinido em sua nuca - e em um surto de energia refrescante, ele sentiu seu corpo todo tentar sair de si mesmo, com partículas sumindo e oscilando enquanto sua forma física vacilava entre um lugar e outro. Era agradável, familiar . . . confortável. Ele já tinha feito isso antes. Seu corpo estava se partindo e dissolvendo - devia ser uma sensação terrível, mas não era; ele se sentia ele mesmo. Ele se esforçou em se manter nesta sensação, rezando para si mesmo que se mais dele sumisse, mais de sua mente voltaria - mas ele só foi puxado de volta por alguma força gigantesca para fora de qualquer porta metafísica que ele tinha começado a caminhar adentro. Puxou e puxou, voltou e voltou, até se chocar de volta em um só corpo, na mesma praia que tentava abandonar. Chocado, ele caiu de joelhos.

Art by Chase Stone
Ilustração: Chase Stone

No ar acima dele apareceu um triângulo brilhante circunscrito por um círculo, e o homem perdeu o fôlego em seus pulmões enfraquecidos.

A refrescância agradável sumiu. Seu corpo estava inteiro, ali ajoelhado na areia, e suas mãos estavam meladas de suor.

O homem puxava fôlego aos solavancos em meio ao seu pânico. Seu coração batia contra um hematoma em seu tórax.

Confuso, o homem cerrou os punhos, respirou fundo e gritou o palavrão mais criativo que conseguia pensar. Um palavrão só, longo e satisfatório, no qual ele refletiu toda a frustração e confusão que pôde.

Depois de terminado, ele ouvia apenas as ondas lambendo a areia em seu ritmo leve.

A noite estava caindo.

Ele analisou seu estado físico. Seus hematomas e músculos doloridos precisavam de descanso, mais do que de qualquer outra coisa - comida e água podiam esperar até a manhã seguinte.

Sentado na areia, ele passou algum tempo tentando se lembrar como havia chegado ali, mas a única lembrança que tinha era do bambu dançando acima dele quando abriu os olhos.

Depois de tentar lembrar como chegou até ali, ele tentou lembrar seu nome.

O homem se lembrava de vários nomes. Lazlo era um nome. Sam também. Mas ele não achava que nenhum desses nomes lhe pertencia.

Então, ele decidiu que descobriria como chegara ali por outros meios.

Não havia ninguém por perto, então ele tirou seu peitoral de couro, sua capa e suas luvas. Ele removeu sua camisa e suas calças, dobrou tudo e organizou cada peça na areia, suspirando com o alívio da brisa fresca em sua pele. Ele olhava para seus pertences quando parou para olhar para sua mão direita, sem luvas, pela primeira vez.

Havia uma cicatriz - uma linha perfeita que seguia por seu antebraço direito. Era um corte reto, cirúrgico; alguém tinha feito isso intencionalmente.

O homem se avaliou para coletar mais pistas. Ele tinha hematomas de alguma batalha recente, mas ele também conseguia sentir mais das cicatrizes retas e profundas que corriam por suas costas. Será que elas eram tão antigas quanto a de seu braço? Quem tinha feito isso com ele?

O homem vestiu suas luvas novamente, e decidiu ruminar sobre essa evidência mais tarde. Ele olhou novamente para suas roupas na areia.

O homem tentou imaginar quem vestiria algo assim.

Quem quer que fosse, ele tinha vindo de algum lugar bem mais frio, isso era certo. Os materiais eram pesados, feitos para suportar chuva (ele lembrava de chuva!) e um pouco de frio. O capuz era meio exagerado - não era muito espalhafatoso, mas os padrões desenhados não deixavam a capa nem um pouco sutil. A camisa estava manchada de suor, então ele devia ter caminhado sob calor intenso por algum tempo. As botas eram a parte mais curiosa. Havia um pouco de areia presa dentro da sola, mas era uma areia com textura bem diferente do que a areia da praia onde estava. Esta pista tinha um amarelo mais dourado, era uma areia mais grossa e árida do que a areia branca e fininha onde estava sentado.

O homem franziu o cenho. Não havia suprimento algum. Nenhuma faca. Sem comida, ou corda, ou itens pessoais. Quem quer que seja, esta pessoa não parecia precisar carregar armas.

Ele era tão besta assim, de viajar sem segurança alguma? Ele não achava que sim, mas as provas à sua frente o preocupavam. Talvez suas armas tivessem sido tiradas dele? Improvável - não havia ninguém por perto.

O símbolo na capa chamou sua atenção.

Ele parecia . . . familiar.

Por que era familiar?

A lua estava bem alta no céu neste ponto, e o homem precisava dormir. Ele decidiu refletir sobre o significado daquele símbolo mais tarde.

Ele pisou fundo na areia até um tronco de árvore naufragada, e deitou-se na praia. Parte dele se preocupava com o lagarto que vira antes - talvez ele comesse gente também? Não só ovos? Era um raciocínio falho - se ele comesse humanos, provavelmente ele teria atacado naquela hora - mas talvez haja outros lagartos com apetites maiores.

O homem se sentiu terrivelmente exposto.

Ele jogou sua capa sobre os ombros e prendeu seus olhos, desesperadamente desejando que dormisse a noite inteira sem ser detectado por nada que viva nesta ilha.

O homem adormeceu com suas pernas perto do corpo e um tinido em sua nuca. Se revirou muito na areia da praia em sono profundo - e, sem saber, estava completamente invisível.


Na manhã seguinte, o homem acordou com o sol e ainda não tinha ideia de quem era - então, decidiu se concentrar em cuidar de suas necessidades físicas.

Ele começou a se familiarizar com seu novo lar.

Art by Titus Lunter
Ilustração: Titus Lunter
Art by Titus Lunter
Ilustração: Titus Lunter
Art by Titus Lunter
Ilustração: Titus Lunter

Após aprender o tamanho da ilha (levava um dia de caminhada para circundá-la), ele escolheu como lar um local protegido do vento e do sol por uma concavidade rochosa. Ele construiu um abrigo onde as árvores encontravam a praia. Com a labuta de coletar galhos e amarrar postes feitos de troncos descascados, ele notou como ele não devia se exercitar muito antes de perder a memória. Seus músculos estavam flácidos e sem uso, e o homem se perguntou novamente como ele pretendera sobreviver aqui sem armas ou ferramentas. Ele se fortalecia enquanto trabalhava, e apesar das bolhas e das queimaduras do sol ele conseguiu construir uma plataforma coberta para dormir.

Comida era uma questão de tentativa e erro, mas ele se empolgava ao aprender do que gostava ou desgostava. Com um pedregulho afiado ele criou uma espécie de faca e começou a testar seu paladar. Ele gostava de ostras. Ele gostava da fruta laranja, o que quer que fosse. Ele gostava da fruta verde alongada e das frutinhas vermelhas de arbusto, mas não gostava do tubérculo roxo. Ele sentia coceira na língua, e isso foi atribuído a uma nova descoberta: uma alergia. Que fascinante!

Uma coisa que ele realmente precisava aprender era como fazer fogo.

O sol se punha rapidamente, e algumas nuvens rolavam no horizonte.

Uma segunda bolha começava a se formar na palma de sua mão direita. Ele grunhia com o esforço de esfregar um graveto entre suas mãos cansadas o mais rápido que podia, ignorando a dor e o pus, e a gotinha de chuva que acabara de cair no seu pescoço. Ele contou o ritmo das ondas atrás dele (seis quebradas por minuto) e começou a replicar o ritmo em sua mente, esfregando o graveto em um ritmo intercalado com o das ondas. Suas mãos estavam aquecidas pelo esforço, e seu cenho franzia em concentração.

Uma pluminha de fumaça se levantou do ponto onde seu graveto encontrava a madeira, e ele riu enquanto tentava manter a pequena chama acesa.

O graveto se partiu em dois.

E o tufinho de fumaça sumiu.

Chocado e de olhos arregalados, ele choramingou decepcionado até transformar o som em um grunhido frustrado que escapou de sua garganta.

"Que ilhainútil!"

O homem sentou-se na areia com os cotovelos apoiados nos joelhos, olhando fixamente para o graveto quebrado acima da lenha. Um monte triste de gravetos e folhas secas estava em volta.

O homem grunhiu mais uma vez e se deixou inclinar para trás, até deitar-se na praia.

Um albatroz sobrevoava sua cabeça em círculos preguiçosos.

Mais um grunhido.

"Por que eu sei o que é um albatroz?" perguntou em voz alta.

O albatroz não respondeu.

Ele se sentou de volta e olhou mais uma vez com olhos apertados para a pilha de gravetos.

Talvez ele pudesse comandar o aparecimento de uma chama.

Ele tirou um pouco de areia das calças e se inclinou para a frente, sentindo o ardor de uma queimadura solar; seu olhar fixado na pilha de madeira à sua frente.

Ele se concentrou e sentiu mais uma gota de chuva cair sobre suas costas nuas enquanto o céu carregado deixava um arrepio de gelar os ossos.

O homem precisava de fogo. Ele precisava de fogo mais que absolutamente tudo no mundo—

Um arrepio levantou os pelos de sua nuca e um tinido percorreu sua espinha.

Uma nuvenzinha de fumaça começou a subir da lenha.

Ele ficou de pé em um pulo e se afastou. Fumaça?! Fumaça!

Parte dele estava em alerta - isso era real?! - mas o resto dele estava em êxtase e não se importava. Surpreso, o homem gritou "Consegui!"

A fumaça começou a subir. Sem parar de rir, o homem caiu de joelhos e começou a alimentar a chama com gravetos e folhas pequeninas. Ele podia chorar, de tão feliz que estava.

Apressando-se, o homem ficou de pé e começou a jogar mais galhos, folhas, e madeira que aparecera na praia. Ele não se importava se usasse toda sua lenha; ele precisava de fogo.

A chama era uma fogueirinha bem aconchegante, agora. O rosto do homem se abriu em um sorriso aberto. Uma risadinha escapou dele, e com dedos entrelaçados acima da cabeça, ele esticou o corpo. Ele se afastou para admirar seu trabalho.

Aquele fogo era a coisa mais linda que ele já vira. Ele supôs que já vira coisas mais bonitas, mas como não lembrava de nenhuma elas eram irrelevantes e não se comparavam com a beleza à sua frente. Isto era mais bonito que qualquer pintura e mais precioso do que qualquer joia.

O momento foi interrompido pelo ronco do estômago do homem.

Ah, é! Comida! Ele precisava comer!

Ele tinha achado um peixe na beira da praia algumas horas mais cedo. Era um troço feio e com aparência antiquíssima, com escamas chatas e losangulares e um olhar vago em seus olhos mortos.

O homem atravessou o peixe com um graveto, que apoiou acima da chama.

Ele sentou-se mais confortavelmente, pronto para virar o peixe quando um lado estivesse pronto.

Mas o peixe apenas olhava para ele.

Suas escamas não queimavam. Sua gordura não chiava. Ele não chamuscava. O peixe estava completamente banhado pela chama, mas não deu sinal algum de estar sendo cozido.

O homem estava muito confuso.

Ele colocou sua mão acima da chama e notou que ela não emanava calor.

Sua confusão se transformou em medo e ele enfiou seu braço diretamente na chama.

O fogo estava tão frio quanto o peixe morto.

Com medo, o homem puxou sua mão para perto do coração e se afastou atrapalhado da fogueira.

"Mas o quê?! Não! Não, não, não, não, não!"

A chama tremeluziu em um azul - azul?! - brilhante e desapareceu sem cerimônia.

Mas ele viu fumaça! Ele viu o fogo consumir a lenha! Mas ainda assim, ele não sentiu calor algum antes da fogueira sumir.

O temor do homem tropeçou para dentro de uma onda de pânico absoluto.

Ele se encostou em uma palmeira e olhou horrorizado para o peixe no graveto, rapidamente tentando organizar as pistas que tinha para chegar a uma conclusão racional.

Ele estava preso, desmemoriado, sem comida, abrigo ou habilidade alguma . . . e agora, além de tudo, estava perdendo a noção de realidade.

Solenemente, o homem concluiu que ele enlouquecera.


Passou um bom tempo desde o incidente com o peixe, e o homem veio a aceitar que as coisas eram muito mais simples, agora que ele era louco.

Se era verdade que sua mente se desligou da realidade, ele não precisava se preocupar com a logística de saber como chegara até ali, ou de quem tinha sido antes. Sua sanidade era irrelevante se a única verdade que ele podia viver era sua realidade atual.

Que conclusão libertadora!

E assim, o homem passou a fazer coisas que uma pessoa que acreditava estar presa em uma ilha faria.

Ele se deleitava em construir ferramentas novas. Um cesto de gravetos entrelaçados, uma arapuca rudimentar, e até mesmo uma faca mais afiada para abrir ostras. O homem se decidiu a construir uma nova ferramenta a cada dia, e se orgulhava de cada uma delas. Era quase divertido ter uma infinidade de tempo para construir soluções novas para seus problemas.

Enquanto explorava e aprendia, ele se acostumava às visões que tinha pelo caminho.

Algumas tinham mais forma do que outras. Elas costumavam ser humanoides, com faces e vozes distintas.

Uma mulher com pele branca como neve e cabelo branco, em um penteado elaborado, flutuava atrás dele e anotava suas ações em um diário. Uma meirinha com expressão severa, usando uma capa azul e armadura prateada. Um leonino sem um olho.

Em seus momentos mais solitários, ele às vezes via uma mulher de roupa violeta no canto do olho. Seu peito sentia um puxão de ansiedade quando ela passava por ele.

O homem sabia que eram alucinações e que elas não eram reais.

Elas não têm poder sobre mim. Né?

Ele ignorava as visões enquanto elas iam e vinham, mas às vezes elas se recusavam a ser ignoradas.

"Você se superou mesmo dessa vez, hein?"

Esta visão aparecia sempre que o homem tinha dificuldade em fazer algo.

Ele tinha ombros largos e sua pele cor de oliva tinha um brilho de suor abaixo de sua armadura brilhante. A alucinação assistia por cima dos ombros do homem enquanto ele tentava esculpir um anzol.

"Escuta, você não tem muito preparo pra isso. Deixa que eu faço." A voz da visão era áspera, mas amigável.

Mas lhe soava condescendente.

O homem se irritou.

"Eu consigo fazer sozinho."

A alucinação suspirou. "Nós dois sabemos que você não tem preparo para isso. Deixa que eu faço enquanto você vai lá filosofar no outro canto da praia."

"Eu disse que eu consigo sozinho." O homem deixou que a irritação transparecesse em sua voz.

"Não, você não consegue. Eu mando aqui e faço tudo, você fica no canto. É assim que funciona."

Em resposta, o homem jogou seu anzol na alucinação. Ela atravessou o olho da figura e caiu na areia logo atrás.


As alucinações ficavam mais frequentes quando ele se entediava.

"Políticas e procedimentos, seção 12, item 4."

Surpreso, ele perdeu o fôlego. Uma mulher de cabelos negros estava o encarando a alguns metros dele, apoiada em uma bengala. Ela usava um vestido branco, com o emblema de um sol na frente. Uma capa escura caía sobre seus ombros e roçava a areia, e sua face deixava claro que ela tinha uma missão a cumprir.

Impaciente, ela tamborilava com um dedo no apoio da bengala.

"Eu disse 'Políticas e procedimentos, seção 12, item 4. Representantes oficiais de uma guilda podem ter passagem segura de um local controlado pela guilda de sua residência para outro local por meio de um mandado oficial'. Você concorda ou não que esta lei está em efeito?"

Ela o seguia por cada arapuca montada, espiando por sobre seu ombro enquanto ele preparava as armadilhas novamente, e o encarava feio enquanto ele carregava os lagartos que pegara para cozinhar em seu acampamento.

Ele enterrava os lagartos com carvões quentes, folhas de palmeira e tubérculos para cozinhar ao longo da tarde. Eventualmente a alucinação desapareceu e o homem suspirou aliviado.

Ele sentou por um tempo, ouvindo os pássaros costeiro acima dele, e decidiu afastar o tédio e tentar construir uma fogueira gigante na praia.

Ele passou muito tempo carregando troncos de árvore para dentro das chamas, na esperança de que a fumaça subisse o suficiente para que algum navio notasse. Até agora não aconteceu, mas talvez fosse hoje.

Seu otimismo foi minguando.

Ele tirou seu chapéu de folha trançada de palmeira e o pousou na areia. O calor da fogueira e do sol de meio-dia era arrebatador. Ele se afastou da fogueira e entrou no mar.

A água era mais quente no raso, mas ainda era um alívio do calor. Sua queimadura solar doía; sob as ondas, ele podia ver peixinhos nadando freneticamente para todos os lados.

Ele conseguia sentir a puxada da maré em suas pernas.

E o gosto do sal na beirada de seus lábios.

E o cheiro da fogueira que estava na praia, misturado com o cheiro de algas marinhas que acabaram na areia.

Tudo parecia . . . real.

Real de um jeito que sua insanidade não devia permitir.

O homem considerou sua percepção da realidade.

Havia outra explicação para isso tudo. Pelo desaparecimento e reaparecimento que seu corpo estranhamente fez, antes, e pelo fogo que não era bem fogo.

E se minhas alucinações são uma expressão mágica?

Ele sabia que existia magia. Ele sabia que existiam pessoas que podiam manipular as chamas, invocar raios e trovões, ou fazer nascer árvores onde nunca nascera antes, apesar de não saber seus nomes. Ou não discernir suas faces.

Ele esquecera tudo o mais sobre si mesmo . . . será que ele teria esquecido algo tão crucial que fazia parte dele?

O homem passou a mão encharcada nos cabelos. Ele foi mais para dentro d’água, e as ondas lambiam seu queixo barbado.

Ele sentia que esta ideia lhe parecia . . . correta. "Eu sei fazer magia" era um pensamento que vinha a ele tão verdadeira e simplesmente quanto "eu sou um homem" ou "eu não gosto de crocodilos."

Ele fechou os olhos e desejou que sentisse aquela coisade novo, aquele arrepio na nuca e aquelas ondas de poder. Ele buscou em sua mente e desejou que criasse.

Quando o homem abriu os olhos, ele viu uma visão dele mesmo, de pé acima da água logo à sua frente.

A imagem tinha uma expressão vazia na face, mas de qualquer outro modo era idêntico ao homem, calmo e impossivelmente de pé sobre a superfície da água.

Chocado, o queixo do homem caiu.

A ilusão parecia tão sólida quanto carne, e impressionava com seus detalhes precisos. O homem se divertiu com o fato de que não lembrava do próprio nome, mas lembrava de cada detalhe exato sobre o próprio corpo: músculos tonificados, uma barba pueril no rosto, uma queimadura solar que criou bolhas em seus ombros nus. Ele viu até suas cicatrizes — as cicatrizes dele — pequenos marcos de uma vida bem vivida.

Ele esticou a mão e tentou tocar a perna da ilusão. Seus dedos a atravessaram como se estivessem passando pelo ar.

Incrível.

O homem colocou as mãos ao longo do corpo, e a água estava na altura de sua cintura.

Ele deu um sorriso aberto de orelha a orelha.

Concentrou-se, sentiu o calafrio familiar em sua nuca, e a ilusão desapareceu.

Seu sorriso estourou em um grito de alegria.

Ele correu para a praia, chutando a areia no caminho.

"Eram manifestações de fragmentos da minha memória! Eu não estou alucinando - eram ilusões que eu criei! Eu sou um mago!"

Ele estendeu sua mão e desejou que a ilusão de um cavalo de tração se materializasse. E aconteceu, através de uma névoa azul, e o cavalo deu um trote largo em volta do homem. Ele tentou tocar o cavalo e passou a mão direto por sua pelagem malhada e cinzenta. A ilusão correu, saltou por sobre a fogueira, e galopou pela praia; era uma nuvem noturna passando graciosamente pelo branco intenso da areia.

O homem ria com a loucura disso tudo. Ele riu de sua própria habilidade, de como fora tolo - mas acima de tudo, naquele momento, ele ria de como outros habitantes da praia acreditavam que sua criação era real. Gaivotas alçavam voo quando o cavalo se aproximava; insetos voavam para perto e tentavam descansar em sua crina; apesar de não deixar marcas na areia, esta criação parecia mais real do que qualquer fogueira, lança ou rede que já existira. Sua imaginação era grande demais para segurar, e sua mente tinha apenas os limites de suas vontades. O homem não precisava ter nome ou um passado, pois naquele momento ele sabia exatamente quem ele era.

Ele dispensou o cavalo e criou um elefante; dispensou o elefante e criou um monstro marinho; dispensou o monstro marinho e transformou o dia em noite, enchendo a praia com arranjos infindáveis de estrelas delicadas.

Ele riu até chorar.

Após um momento de lágrimas de alegria em meio à galáxia de estrelas ilusórias, seu coração ficou pesado.

Ele estava de pé, em uma noite sem fim - um vazio perfeito com pequenos pontos de luz.

O homem estava incrivelmente sozinho.

Ele dispensou a ilusão das estrelas e da noite, e encontrou-se na praia que estava igualmente vazia.


No dia seguinte, ele notou que não sabia qual seria o som de outra voz humana.


No outro dia, ele não saiu da plataforma que construiu para dormir.


O homem voltou ao bambuzal.

Ele veio usando as roupas que usava quando chegou, e deixou-se no mesmo lugar onde acordou.

Ele olhou por um longo tempo para o céu azuleno acima dele.

Ele tentou desejar ir embora, mas nada aconteceu.

Ele fechou os olhos e tentou se lembrar como era o seu lar ou seus amigos, mas nada veio à mente.

"Por favor, me deixa ir embora," ele disse para ninguém.

O vento balançava o bambu acima dele, e o homem tampou a face com suas mãos, choramingando.

Talvez ele não estivesse louco. Talvez ele estivesse morto. Talvez esse fosse algum tipo de pós vida horrendo. Talvez ele nunca existira antes disso e estava fadado ao que quer que isso fosse para sempre.

Mesmo que ele não pudesse ir embora, pelo menos ele queria ter alguém para conversar.

"Você ‘tá péssimo," ronronou uma voz acima dele.

O homem tirou as mãos do rosto. De pé e inclinada acima dele, estava a ilusão de uma mulher. Ela tinha cabelos negros como um corvo, olhos cansados e uma expressão desdenhosa. Ela estava de braços cruzados, e seus braços tinham luvas longas de cetim violeta.

"Os músculos foram uma boa mudança, mas você fica horrível com barba." Seus lábios se curvavam em desdém e zombaria.

O homem balançou a cabeça e lágrimas se acumularam no canto de seus olhos.

"Eu não sei quem você é."

"Claro que não, garoto."

Ela o olhou de cima a baixo. "Você não sabia quem eu era antes, e não sabe agora. É difícil criar confiança quando nenhum dos dois confia um no outro."

O homem decidiu parar de se importar que suas ilusões não fossem reais. Ele precisava desesperadamente conversar com alguém.

"Quem eu era, antes de vir para cá?"

"Você não era quem pensava que era, isso eu tenho certeza. Ninguém leu você direito, mas eu sim. Você nunca foi um líder, ou um detetive, ou um acadêmico; você era um guri assustado brincando de faz-de-conta."

O homem engoliu em seco.

"Você consegue enganar o resto do mundo com sua magia e suas ilusões, mas nunca conseguiu me enganar."

O homem queria soluçar. Voltar a dormir. Passar fome até que tudo acabasse.

"Eu não sei quem você é," ele admitiu por fim, com voz embargada.

A mulher se ajoelhou e olhou no fundo de seus olhos com um sorriso crocodiliano.

"Eu sou a melhor coisa que já te aconteceu."

O homem estendeu a mão para afastá-la, mas a imagem da mulher tremeluziu em uma névoa azul. Ela não estava mais lá.

Seu coração estava a mil. Seu cenho, amarrado em desespero.

Aquele desespero começou a espremer e se tornar fúria.

Ele ficou de pé, cerrou seus punhos, e deu um soco em um caule de bambu. Seu punho sangrou com o impacto.

Mas ele nem se importou. Ele andava de um lado para outro e tentava acalmar seu coração.

"Deu de criar ilusões involuntárias!" disse ele, e algo no fundo de sua mente tilintou em afirmação mágica. Não iria acontecer novamente.

Ele tinha controle sobre sua própria mente. Ele guiava seus próprios talentos.

O homem deixou sua mente vagar, e perguntou-se se a ilusão que vira era a manifestação de algo dentro dele mesmo, ou uma memória quebrada de alguém que era próximo a ele.

Pode ter sido um romance. Pode ter sido uma amiga.

Ele se perguntou se ele tiveraamigos.

Como alguém próximo de uma pessoa daquelas mereceria amigos?

Então, um pensamento lhe ocorreu.

"Não importa quem eu era . . . porque eu posso aprender quem eu sou agora."

Ele disse isso em voz alta, e lhe pareceu real.

"É irrelevante saber quem eu era, porque vou me tornar quem eu quiser."

Ele acreditou nisso com todo seu coração.

E percebeu o que devia fazer.

Ele iria provar para si mesmo que merecia viver.


O homem começou seu trabalho.

Ele trabalhou por cinco dias sem parar.


Ao fim, ele se sentia realizado e exausto ao mesmo tempo.

O homem estava sentado em frente à sua fogueira, comendo frutas que coletara - e uma jangada pequena e firme estava ali perto, sob o céu estrelado e sem nuvens.

Ele se inclinou para conferir os suprimentos e repassar sua lista mais uma vez: água doce para duas semanas (e um destilador solar para usar depois disso), sua rede, sua lança, e o que sobrara de sua capa para proteger-se do sol. Duas cestas de frutas. Seu chapéu, sua faca, material extra para as velas, bambu e corda a mais para reparos. O homem sabia que estava saindo no mar na manhã seguinte para morrer, mas estava desesperado para saber o que estava do outro lado. Tinha que ter alguém no lado de lá.

Ele estava empolgado. E aterrorizado. Ele estava abandonando o único lugar que conhecia na vida, para encontrar o que estivesse do outro lado da água, e a ideia o enchia com uma emoção esquisita. Ele tinha tanto para descobrir ainda.

O homem sorriu. Ele se sentou em frente ao fogo e abriu uma ostra com sua faca de pedra afiada. Ele segurou a concha como se fizesse um brinde com a ilha à sua volta.

"Um brinde à Ilha Inútil!"


Seu primeiro dia no mar foi tranquilo. A Ilha Inútil desaparecera no horizonte, e o azuleno infinito do mar se estendia à sua frente.

O homem estava confiante. Se ele sobrevivera tanto tempo em uma ilha deserta, ele sobreviveria no mar, também.

Ele dormiu bem na sua primeira noite.

E na segunda noite, também.

Mas o mar acinzentou e encrespou no terceiro dia.

Na quarta tarde, as ondas estavam mais altas do que seu mastro.

A chuva grossa batia contra sua pele e o céu revirava com a mesma ferocidade que o oceano.

Paredes de água empurravam sua jangadinha para um lado e para o outro, espirrando água gelada em seus olhos e tirando seu equilíbrio. O homem agarrou as beiradas de sua jangada e cerrou os olhos, desejando que tivesse poder sobre os mares e não sobre as mentes.

Um relâmpago fez um arco no céu, seguido imediatamente pelo rugido do trovão.

O homem estava aterrorizado. Ele amarrou um pedaço de corda à sua cintura, com a outra ponta amarrada à sua jangada.

A embarcação foi levantada por uma onda, e ele conseguiu ver no horizonte que havia uma ilha rochosa escarpada e acidentada.

Talvez tenha gente naquela lá?

O homem puxou o lado de sua vela para tentar pegar o vento - bem a tempo da embarcação deslizar onda abaixo para um vale de água, enquanto outra onda altíssima estava à frente.

O homem olhou para cima, viu a onda chegando, e segurou fôlego logo antes de ela se chocar contra sua embarcação.


Ele acordou coberto pela madeira de sua jangada quebrada. Era noite agora, e o mar estava calmo.

A outra ilha estava à vista, a pouca distância. Era uma coisa rochosa e estéril, e os topos dos montes tinham um brilho branco.

Neve? Pensou ele, otimista. Ele olhou com mais atenção. E resmungou. Pássaros.

Ele avaliou seu estado atual. Sua jangada estava em pedaços, mas a cesta com seus pertences ainda estava amarrada ao pedaço de jangada onde ele se prendeu.

O excremento branco sobre a ilha rochosa brilhava na luz do luar. Era quase bonito. Quase.

Exausto e derrotado, o homem usou os pés como propulsão para chegar até seu novo lar.


Ele se arrastou para fora d’água e desabou em um pedaço de rocha acima do nível do mar. Apesar do coro interminável de pássaros costeiros e pássaros-lagarto voadores, o homem dormiu por um dia inteiro.


O homem vacilava entre dormir e acordar. Ele não tinha energia para levantar-se e explorar, mas ele conseguia ver claramente dali que ele trocara uma ilha perfeitamente boa para viver para outra completamente horrível.

Tudo tinha o canto e o cheiro dos pássaros.

No fundo de seu coração, ele sabia que devia ter ficado na Ilha Inútil e tido uma vida feliz com suas ostras e sua rede de pesca, e sua imaginação sem limite.

Mas um pedacinho dele sabia que de algum modo ele podia simplesmente . . . ir.

O homem decidiu replicar o experimento que fez em seu primeiro dia.

Talvez agora funcionasse.

Ele se deitou de barriga para cima na rocha e fechou os olhos. Ele precisava encontrar o que havia nele que lhe dava a sensação de que poderia fazer algo impossível.

Ele respirou fundo, deixou o som das ondas e o calor do sol saírem de sua percepção, e em sua mente ele imaginou um poço.

Seus lados eram de ardósia lisa e cinza, mas enquanto o homem passava as mãos pelas beiradas ele conseguia sentir que não estava cheio de água, mas de uma infinidade de objetos e lugares, cheiros, gostos, gente, amigos, amores, uma vida inteira de memórias. E agora elas se foram.

Ele sentou-se na beirada do poço e desceu mais fundo em sua mente. Sua descida foi lenta e controlada, afundando graciosamente em si mesmo. Ele conseguia perceber que a profundidade do poço não mudara, mas somente o topo estava cheio de evidências e memórias. Era uma selva chuvosa e fértil, com areia fininha e pássaros familiares. Logo abaixo, as paredes estavam ladeadas de bambu, e ele viu o brilho do sol refletido nas escamas dos peixes, e um cavalo de tração ilusório perfeito, cinza da cor da chuva. Estas memórias eram cheias de orgulho, aprendizado e realização.

O homem sorriu. Não era muita coisa. Mas era ele.

Ele continuou a descer.

O que lhe era familiar sumiu, mas ele sentiu que se movia na direção de um tipo diferente de conhecimento. O homem fez uma nota mental de um dia estudar as diferenças entre os tipos de memória, pois aqui as paredes tinham textura - veludo em um canto, couro em outro, e um pedaço com espinhos endurecidos. Ao passar de uma superfície para outra, ele sentiu a vastidão da variedade de coisas que ele conheceu e acumulou conhecimento em sua outra vida - conhecimento que ele não lembrava de ter aprendido, mas que estava feliz em ter retido. Ele via a linguagem, aritmética, como amarrar suas botas, e como fazer uma xícara de café (ah, que atrocidades horrorosas ele não faria por uma xícara de café bem quente...). Ele riu feito criança. Havia tanta informação costurada nessas paredes, e de algum modo maravilhoso, tanto espaço para aprender mais.

O homem desceu mais e a ardósia do poço se abriu em nuvens espessas de névoa.

O que estava aqui agora já se fora.

Mas tinha uma coisa que ficou ali.

Estava ali, suspensa como uma joia prateada - uma luz brilhante presa no poço de sua mente.

O homem encontrou a parte que o permitiria escapar.

A parte que o fazia ele mesmo.

Ele não sabia o que era, mas ele já a sentira uma vez, e ele sabia que era sua última chance.

O homem olhou para o céu acima e subiu: passou pelas texturas de seus conhecimentos, pelas memórias de sua amada Ilha Inútil, para fora do poço e de volta para seu corpo.

Ele abriu os olhos e tentou ignorar os pássaros que batiam asas e grasnavam à sua volta.

O homem respirou fundo e virou aquela joia em si mesmo que descobrira nas profundezas de sua mente.

O homem sentiu seu corpo murchar, e tentou afastar o pânico quando via seus braços pestanejarem para dentro e fora da realidade. Pedaços dele tentavam ir embora em uma névoa azul delicada. E mais uma vez ele se sentiu sendo puxado violentamente de volta, caindo destrambelhado contra as rochas de sua nova ilha. Aquela insígnia já familiar de círculo e triângulo apareceu sobre sua cabeça, e o homem suspirou quando sua forma condensou-se novamente em carne.

Ele falhou.

O homem olhou em volta. Ele estava cercado por todos os lados pelas ondas vazias, rochas cobertas de excremento e dos pássaros costeiros, além de um sol forte que vai causar bolhas.

Ele chegou a uma conclusão simples. Ele não sobreviveria muito tempo ali.

"Eu vou conseguir pensar em algum jeito de sair," disse ele por uma boca seca e com lábios rachados. "Eu vou pensar em algum jeito de sair dessa."

Então, o homem deitou-se na rocha, fechou os olhos e desceu pelo poço de sua mente em busca de alguma resposta.


Ele acordou com gritos a alguma distância.

"Alto lá! Homem na praia!"

"A gente manda o Malcolm?"

"Não. Prepare o bote. Quero olhar bem para ele primeiro."

"Descendo com a embarcação de fora!"

Um navio imenso de madeira estava próximo do afloramento rochoso repleto de pássaros. Suas velas estavam amarradas ao que pareciam milhas de corda intrincada. As cores berrantes das velas tomaram sua visão de assalto com um tom que ele não vira desde que acordou na Ilha Inútil. Uma estátua de pedra estava amarrada sem muita cerimônia à popa do navio, e ao lado dela estava escrito com letra graciosa a epígrafe: A Truculenta.

Ele fechou os olhos.

A exaustão o consumiu; minutos mais tarde, ele ouviu o impacto de remos que batiam na água.

Uma voz rouca de mulher gritava acima do barulho das ondas.

"Eu te diria pra não ir embora, mas seria um pouco discutível. Parece que você transplana e dá de cara em uma janela, não é?"

O homem estava cansado demais para olhar para a fonte daquela voz. Agora, ela estava perto. Quem quer que fosse, ela tinha remado até ele.

"Meu navio precisa de uma carranca nova, Beleren! Me diga para quem está trabalhando e sua morte será indolor!"

Beleren? Esse é o meu nome? Ele se perguntou em meio à sonolência.

Pés bateram na água e caminharam. Gaivotas grasnaram. Uma âncora desceu sem cerimônia e o impacto foi rude. A mulher deve ter pulado para fora do bote, para investigar sozinha.

Ele a ouviu perdendo o fôlego com o susto que levara logo acima dele.

Eu ‘tô tão mal assim? Perguntou-se. Mentalmente, ele reconheceu: Eu me sinto mal assim. Devo estar mal mesmo.

Os olhos do homem se abriram um pouco, rebatendo uma crosta grosseira de sal e sono.

Ele olhou nos olhos de uma mulher suntuosa que ele só pôde supor que fosse a capitã do navio.

Ela era impressionante.

Art by Chris Rahn
Ilustração: Chris Rahn

A mulher era alta e esguia, sua pele tinha um tom esmeraldino e seu cabelo lembrava tentáculos dançando curiosamente ao vento. De algum modo, ele sabia que ela era uma górgona, mas ele não sentia medo em olhar nos olhos dela.

Seus olhos estavam arregalados olhando para ele de cima, encarando-o com uma expressão de choque.

O homem percebeu com uma proporção igual entre medo e empolgação que esta mulher sabia exatamente quem ele era.

"Jace, o que diabos aconteceu com você?"


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